segunda-feira, 29 de julho de 2019

Beata Imelda Lambertini, Devota da Eucaristia - 12 de maio

    
     Imelda Lambertini pertencia a uma nobre família da Bolonha, Itália. Nasceu provavelmente no ano de 1320. Era filha do Conde Egano Lambertini e de sua segunda esposa, Castora Galluzzi; no batismo a menina recebeu o nome de Maria Madalena.
      Seus pais eram muito piedosos e amavam sua filha mais do que tudo no mundo. Eles percebiam que embora a menina lhes devotasse também um grande afeto, não era feita para este mundo. Frequentemente sua mãe a encontrava ajoelhada em algum canto do palácio em profunda oração. Toda vez que as pessoas falavam de Deus seus olhos brilhavam. E seus pais notaram que várias vezes, quando se mencionava Jesus no Santíssimo Sacramento, sua face se tornava quase transparente. Ela desejava ardentemente fazer a Primeira Comunhão, mas ela não tinha ainda a idade exigida na época.
     Apesar de sua pouca idade, após insistência contínua dela, os pais a deixaram ficar com as monjas de um convento próximo. Era comum, na época, as meninas serem educadas por religiosas em seus mosteiros.
     Ela entrou no mosteiro das dominicanas de Santa Maria Madalena do Val di Pietra, onde hoje existe o convento dos capuchinhos, e deram-lhe o nome de Imelda. A comunidade era composta das Cônegas Regulares de Santo Agostinho, que no fim do século passaram para a Regra Dominicana.
     No convento, a pequena Imelda era como um peixe dentro d’água. Ela amava o silêncio, os longos corredores de pedra com seus belos arcos, os hábitos branco e preto das monjas, os cânticos, as orações, o trabalho. Mais do que tudo, ela amava o tabernáculo. Finalmente ela estava sob o mesmo teto com o seu Jesus. Sempre que os horários do mosteiro o permitiam, lá estava ela de joelhos no coro observando do alto a capela do convento, seus olhos fixos no tabernáculo.
     Na vida comunitária ela era como um raio de sol no meio de tantas irmãs adultas. Devido a sua tenra idade, a Reverenda Madre também não queria que Imelda participasse de todos os atos da comunidade.
     Dois anos se passaram.  Somente uma coisa a entristecia na sua vida no convento: ela ainda não tinha conseguido receber a Primeira Comunhão. Quando ela via as irmãs comungando sua alma ardia de desejo de estar entre elas. Às vezes ela não conseguia conter suas lágrimas. Então, ela suplicava aos céus para terem misericórdia dela e encontrar uma maneira de fazê-la comungar.
     Na Vigília da Ascensão, dia 12 de maio de 1333, Imelda assistiu a Santa Missa na capela, junto com outras educandas e as Irmãs. Ao chegar a hora da Comunhão, ajoelhada, Imelda rezava com fervor desejando receber Jesus.
     No fim da Missa, quando as monjas saíram do coro em fila, a última virou-se para olhar a pequena figura branca ainda de joelhos em oração. Imelda normalmente permanecia mais tempo lá, sem se mexer e absorvida na oração. A comunidade, acostumada com este seu hábito, deixava-a ficar.
     Foi quase que automaticamente que a irmã olhou para trás para dar uma olhada e para se encantar com aquela pequena maravilha de piedade Eucarística. A respeitosa irmã parou espantada, e ficou como que pregada ao solo. Lá estava a menina ajoelhada, com a cabeça baixa, como sempre, mas pairando sobre ela havia uma Hóstia branca, brilhando no meio de uma suave luminosidade.
     Avisada pela irmã, a comunidade toda se apressou em voltar para o coro e caiu de joelhos diante do incrível sinal. A Madre Superiora entendeu. Não havia dúvida que Nosso Senhor queria que aquela menina O recebesse. Ela chamou o capelão que rapidamente se aproximou com uma patena de ouro. Assim que ele chegou perto da menina ajoelhada, a Hóstia desceu sobre a patena.
     Neste momento, Imelda, que o tempo todo tinha permanecido com a cabeça baixa e os olhos fechados, vagarosamente levantou sua face radiante e abriu seus lábios. Tomando a Hóstia, o padre capelão deu-lhe a Comunhão. Ela abaixou a cabeça uma vez mais e permaneceu imóvel.
     Após um longo tempo, a Madre Superiora se aproximou dela. Tomando gentilmente Imelda pelos ombros, a boa monja tentou fazê-la erguer-se, mas Imelda caiu em seus braços. Sua face tinha uma expressão de inexprimível beleza.
     Imelda tinha dito certa vez, "Eu não sei como se pode receber Nosso Senhor e não morrer!" Agora, ela O tinha recebido e o seu primeiro encontro com Jesus Eucarístico fora demais para seu pequeno coração ardente. Ela se fora com Ele.
     Em 1582, as dominicanas se transferiram para o interior dos muros de Bolonha, obtendo da Cúria a transladação das relíquias da Beata, que hoje se encontram na igreja de São Segismundo. Desde então o seu nome foi inserido no catálogo dos Santos e Beatos da Igreja da Bolonha.
     Sob o pontificado de Bento XIV (1740-1758), que a recordou em uma obra sobre canonizações dos Servos de Deus, o culto da beata foi confirmado. Porém, a beatificação somente foi concretizada com o Papa Leão XII em 20 de dezembro de 1826. A canonização foi retomada em 1921 prosseguindo até 1942, quando foi paralisada por dificuldades de caráter histórico.
     As relíquias de Imelda repousam num belo relicário na Igreja de São Segismundo, em Bolonha. Na imagem que a representa, sua bela face é iluminada pelas luzes de um êxtase e parece dizer: "Meu Jesus, Ele é minha recompensa imensamente grande!"
     A pequena Imelda Lambertini é festejada no dia 12 de maio. Em 1908, São Pio X declarou-a patrona das crianças que fazem sua Primeira Comunhão. Naquele mesmo ano ele decretara que as crianças menores de 12 anos podiam ser recebidas à Primeira Comunhão.
     O culto à pequena Imelda se difundiu com a crescente devoção eucarística no mundo todo. É a patrona venerada dos Pequenos Devotos do Rosário e Benjamins da Ação Católica.
     Na França, o mosteiro de Prouilles fundou em sua honra uma Confraria, aprovada pelo Sumo Pontífice, e colocada sob a direção da Ordem Dominicana.
     Finalmente, o Servo de Deus Padre Joaquim Pio Lorgna (1870-1928), dominicano, colocou sob sua proteção a Congregação que fundou, as Irmãs Dominicanas da Beata Imelda, hoje presente na Itália, Brasil, Albânia, Filipinas, Camarões, Bolívia. 

Etimologia: Imelda = do alemão antigo, Himilhilde: “guerreira (hilde) do céu (himil)” ou “guerreira celeste”.
Imagem de cera que se encontra na Igreja de S. Sigismundo - embaixo, relicário contendo os ossos da Beata Imelda



Igreja de São Sigismundo, Bolonha, Itália

Postado em 11 de maio de 2016 no blog Heroínas da Cristandade

quinta-feira, 4 de julho de 2019

Venerável Antonieta Meo, a “Nennolina”, pequena grande mística – 3 de julho

     
     O câncer não a deixou chegar aos 7 anos, mas o amor por Jesus e Maria lhe deu forças para viver com incrível profundidade um desafio extraordinário. Antonieta Meo, chamada carinhosamente de “Nennolina”, poderá tornar-se a santa mais jovem da Igreja, excetuando-se os mártires: ela tinha apenas 6 anos de idade quando faleceu devido a um câncer.
     Antonieta Meo nasceu em Roma (Itália), no dia 15 de dezembro de 1930, numa família abastada. A casa da família Meo está a poucos passos da Basílica da Santa Cruz de Jerusalém. “Minha irmã”, diz sua irmã Margarida, “era uma menina alegre, inquieta e travessa, assim como todas as crianças dessa idade”. Aos três anos, em outubro de 33, frequentou o jardim de infância das religiosas que está a dois passos de sua casa. “Ia de boa vontade”, conta sua irmã, “e frequentemente quando brincávamos juntas dizia: 'Eu me divirto muito na escola … iria até de noite!'. Apegou-se à professora e as freiras diziam à minha mãe: 'Não há quem a detenha! Mas é muito esperta e aprende rápido. É uma menina madura para a idade que tem'”. Dois anos mais tarde inscreveram-na na Ação Católica Italiana, no grupo das mais pequeninas.
     Aos 5 anos, a pequena sofreu uma queda e machucou um joelho, que ficou consideravelmente inchado. Os dias passavam e a menina não melhorava. Os médicos, que no começo não entenderam a natureza do problema, acabaram diagnosticando osteossarcoma, ou câncer nos ossos, e tiveram de lhe amputar a perna, em 25 de abril de 1935.
     Nennolina passou a usar uma pesada prótese ortopédica, mas nunca se desanimou nem deixou de continuar brincando com as outras crianças apesar da muita dor que sentia. Já nessa tenra idade, ela tinha um conceito do valor do sofrimento, incompreensível sem a graça de Deus.
     Aos 6 anos, a menina começou a ir à escola com a prótese que lhe causava muitos transtornos e uma dor intensa, mas oferecia tudo a Jesus: “Cada passo que eu dou, que seja uma palavrinha de amor”, dizia. No dia do aniversário da amputação, quis celebrar com um grande almoço e com uma novena a Nossa Senhora de Pompeia, porque foi graças a esse acontecimento que ela pôde oferecer seu sofrimento a Jesus.
     Quando encontrava um pobre, queria oferecer-lhe os vinténs de que dispunha. Gostava de frequentar a escola e o catecismo, e a Jesus assim escrevia: “Vou com entusiasmo, porque aí se aprendem muitas coisas bonitas sobre Ti e teus Santos”.
     Esses encontros de instrução na fé são aproveitados por Antonieta para primeiro ditar à sua mãe e depois a escrever suas cartas que a cada noite colocará debaixo de uma imagem do Menino Jesus “para que ele viesse de noite para ler”.
     “Começou como uma brincadeira”, diz sua mãe no processo, “quando lhe disse que escrevesse uma carta à madre superiora das freiras que a educavam para pedir-lhe permissão de fazer a primeira comunhão em sua capela na noite de Natal. Assim que, muitas vezes, de noite, depois de rezar a oração ao Anjo da Guarda, Antonieta acostumou-se a me ditar 'poesias' (assim ela chamava), primeiro para mim, depois para seu pai e Margarida, em seguida para Jesus e a Virgem. Pegava o primeiro pedaço de papel que encontrava e não parava de escrever o que ela me ditava, sorrindo, indulgente com o que me ditava com tanta simplicidade e segurança”.
     A primeira carta está datada de 15 de setembro de 1936. A partir de então, suas cartas se sucedem, expressando um amor simples, terno e infantil a Jesus, Maria e seus pais; mas ao mesmo tempo uma clara consciência, assombrosa em uma menina de sua tenra idade, de quem é Jesus e como O segue pelo caminho da dor.
     Assim, para surpresa de sua mãe, Nennolina escreverá como as grandes santas do sofrimento, pedindo que lhe concedesse almas para poder salvá-las. “Via que a menina sabia se expressar muito melhor do que eu pensava”, diz sua mãe, “mas acredito que seja inútil dizer que em casa não davam a menor importância a estas cartas que se deixavam em qualquer parte e muitas se perderam”.
     Antes de aprender a ler e escrever, ela havia ensaiado suas primeiras palavras escritas com a ajuda da mãe: os nomes de Jesus e de Maria.
     Em suas cartas, falava à sua querida Nossa Senhora, ou “Madonna”, em italiano, com muito afeto e emoção: “Querida Madonnina, a senhora é tão boa! Pega o meu coração e leva para Jesus”. Nennolina compreendeu o sofrimento de Maria por seu Filho e escreveu: “Querido Jesus… Para ti, que sofreste tanto na cruz, eu quero oferecer muitas florzinhas e quero estar sempre no Calvário bem pertinho de ti e da tua mãezinha” (28 de janeiro de 1937).
     Antonieta escreveu a Jesus 105 cartas, e outras a Maria Santíssima, a Deus Pai, ao Espírito Santo, uma à Santa Inês e outra à Santa Teresa do Menino Jesus. Sempre pedia a Jesus a ajuda de sua graça; não deixava nunca de pedir a Ele e à sua Mãe a graça para os que a rodeiam, para quem se encomenda a suas orações e para os pecadores. Colocava sua própria assinatura e escrevia assim: “Antonieta e Jesus”.
     Nennolina se dirige a Jesus e Maria com ternura confiada. Suas cartas terminarão sempre com abraços, carícias, beijos dirigidos a seus destinatários celestiais. E desta confiança são testemunhas também as freiras, que muitas vezes viram a menina antes de sair da igreja aproximar-se ao tabernáculo e exclamar: “Jesus, vem brincar comigo!”. Escreverá também em suas cartas, desejando tê-lo sempre por perto: “Querido Jesus, amanhã venha para a escola comigo”. Nos meses que a separam da Noite de Natal suas cartas expressarão todo seu amor por Jesus e o ardente desejo de recebê-lo em seu coração. Conta sem cessar os dias, as horas, os minutos.
     Na noite do Natal de 1936 recebeu com ardor a primeira Comunhão. Naquela noite de Natal, apesar do aparelho ortopédico causar dor, os presentes a viram no final da missa permanecer mais uma hora ajoelhada, quieta, com as mãos juntas.
     Poucos meses depois, em maio de 1937, ela recebeu a Confirmação. “Depois da Confirmação, Antonieta começou progressivamente a piorar. A fadiga e a tosse não lhe davam trégua. Não conseguia se manter sentada e teve que ficar de cama. Estava sofrendo, mas dizia sempre a todos, inclusive a mim: ' Estou bem!'. Às vezes com grande fadiga, mas queria rezar suas orações de sempre da manhã e da noite. Pediu então que o sacerdote lhe trouxesse a comunhão todos os dias, e as horas que seguiam a comunhão eram cada vez mais tranquila”. […]
     “Enquanto podia, também me pedia que escrevesse suas cartas”. A última está datada de 2 de junho. Esta carta terminará nas mãos de Pio XI. “Alguns dias depois, veio visitar Antonieta o professor Milani, primeiro médico pontifício, chamado pelo Dr. Vecchi para uma consulta. ... Meu marido falou-lhe das cartas que ela escrevia. Pediu para ver a última e eu não me atrevi a negar-me. Peguei a carta que havia deixado naquele dia e a mostrei. Ao lê-la disse que queria falar ao Santo Padre sobre Antonieta e pediu permissão para levar a carta. Respondi titubeante: “É que … não sei … se …”. “Mas, senhora”, disse, “trata-se do Papa!”.
     A amputação da sua perna não bloqueou o tumor, que se difundiu e chegou à cabeça, à mão, ao pé, à garganta e à boca. Tanto as dores da enfermidade como os tratamentos com que se procura curá-la eram muito intensos.
     Embora a sua dor fosse ficando cada vez mais violenta, Nennolina parou de se lamentar. Uma religiosa enfermeira da clínica onde ela se tratava testemunhou: “Certa manhã, enquanto ajudava a enfermeira a arrumar o quarto da criança, entrou o pai dela, acariciou a menininha e lhe perguntou: ‘Você está com muita dor?’. E Antonieta respondeu: ‘Paizinho, a dor é como o tecido; quanto mais forte, mais valor tem’. Depois a religiosa acrescentou: “Se eu não tivesse escutado isto com meus próprios ouvidos, não teria acreditado”.
     Nos dias seguintes, com incrível fortaleza continua sorrindo até para as enfermeiras que vão medicá-la, apesar da metástase ter invadido e despedaçado seu corpinho, apesar da massa tumoral lhe oprimir o peito até o ponto de deslocar o coração.
     Todos testemunharão no processo o desconcerto perante sua extraordinária serenidade. O pai diz no processo: “Um dia, já muito grave, decidi que administrassem em minha pequena a Extrema Unção. Perguntei a Antonieta: 'Sabe o que são os santos óleos?'. 'O Sacramento que dão aos moribundos', respondeu. Eu não queria perturbá-la, então acrescentei: 'Às vezes traz a saúde do corpo…'. Antonieta negou-se. 'É muito cedo', disse, e eu não insisti. Mas quanto mais tarde o sacerdote lhe disse que os santos óleos aumentam a graça, Antonieta, que escutava atentamente, respondeu: 'Sim, eu quero'. Respondeu com tranquilidade a todas as orações, rezou a contrição, em seguida deu as mãozinhas abertas para que o sacerdote as ungisse. Beijou com ternura o crucifixo de sua primeira comunhão. Tudo aconteceu com simplicidade de paz”.
     Estava amanhecendo aquele 3 de julho de 1937 quando seu pai se aproximou para ajeitar o travesseiro e, ao se aproximar para lhe dar um beijo, Antonieta sussurrou: “Jesus, Maria… mamãe, papai…”. “Ficou olhando fixamente diante dela…”, lembra sua mãe. “Sorriu, então exalou um último e longo suspiro”.
     Era um sábado, dia da sua “Madonnina”. Seu corpo está hoje na Basílica da Santa Cruz, em Roma, na qual está representado, aliás, o Calvário de Nosso Senhor Jesus Cristo.
     Foi declarada Venerável pelo Papa Bento XVI no dia 17 de dezembro de 2007. Sua vida constitui uma testemunha da santidade de todas as crianças que sofrem.

Fontes:

sábado, 18 de novembro de 2017

Nellie Organ, a Violeta do SSmo. Sacramento

   
     Quase um século depois de sua morte, a memória da pequena Nellie Organ é mantida viva por uma página internacional na Internet, onde também são citados dois livros de edição recente, enquanto que na Europa ainda circulam páginas devocionais em recordação da "Pequena Violeta do SSmo. Sacramento", com uma foto da época, em que ela aparece a com seu vestidinho branco da 1ª. Comunhão, divulgada pela "Maison du Bon Pasteur" de Paris e impresso na Tipografia Pontifícia no Instituto Pio IX, de Roma.
     Nellie Organ, nasceu em Cork, na Irlanda católica, em 24 de agosto de 1903. Seu pai, William Organ e sua mãe Mary Aherne Organ se casaram em 4 de julho de 1896 e seu casamento foi logo abençoado com quatro filhos: Tomas, David, Mary e Ellie, a mais nova. Os nomes sagrados foram as primeiras palavras que Ellie (Nellie) aprendeu, e à noite a família rezava o rosário. Sua mãe a ensinara a beijar o crucifixo e as contas maiores, um hábito que Nellie conservou.
     Sua mãe morreu de tuberculose, deixando seu pai, que ganhava muito pouco, com quatro filhos menores de nove anos aos que mal alimentava. Ellie (que era carinhosamente conhecida como Nellie) mostrava sinais de incapacidade: uma séria queda quando era um bebê a havia deixado com a cervical encurvada, afetando sua coluna, o que lhe proporcionava fortes dores e a impedia, segundo ia crescendo, poder sentar-se direita. 
     Seu pai, assumindo finalmente que não podia cuidar de seus filhos como era devido, decidiu deixá-los ao cuidado das instituições. Tomas foi enviado para a Escola dos Irmãos da Caridade em Upton; David ao convento escola das Irmãs das Mercês, Passage West; Nellie, junto com sua irmã Mary, foi enviada às Irmãs da Misericórdia, e ali descobriram que ambas padeciam de tosse ferina por isso foram trasladadas para o orfanato das Irmãs do Bom Pastor, onde foram recebidas e cuidadas. Ali a pequena Nellie tinha todo o cuidado, assistida pelas Irmãs e pela enfermeira, Srta. Hall, que ela começou a chamar carinhosamente de "mamãe".
     As religiosas ficaram logo surpresas com a inteligência precoce da criança e da extraordinária disposição para as coisas de Deus; um instinto misterioso de graça a atraia especialmente à SSma. Eucaristia e à Paixão de Jesus. Para entender esses dons espirituais de Nellie Organ é preciso considerar uma precocidade extraordinária de Fé, que Deus certamente suscita ao longo do tempo a algumas de suas criaturas, enviando-as para o mundo quase como um anjo de passagem, indicando os mistérios do amor e da grandeza de Deus aos seus contemporâneos, para voltar velozmente ao amor infinito do Pai. E acreditamos que essa foi a pequena Nellie, que tanta admiração, devoção, causou na Irlanda e na Europa no início do século XX, tanto assim que cem anos depois de sua morte prematura, estamos aqui falando sobre isso, considerando-a uma tocha acesa que ainda ilumina o caminho para a compreensão do dom de Jesus Eucaristia para a humanidade.
     Transportadas em uma cadeira de rodas ou em uma maca, ela permanecia na igreja como um anjo, com os olhos fixos no Tabernáculo e com as mãos unida. Ela solicitava a cada instante para ser levada pela Irmã enfermeira para tão perto do altar quanto possível, especialmente quando era exposto o SSmo. Sacramento.
     Naqueles nove meses que passou no Instituto do Bom Pastor, o desejo da Eucaristia tornou-se mais intenso: ela via as religiosas, as enfermeiras e as meninas mais velhas receberem a Santa Comunhão durante a celebração da Missa, enquanto a ela, assim tão pequena, não era concedido. De resto, devemos nos lembrar que a Primeira Comunhão, antes de 1910, não podia ser dada, a menos que a criança tivesse pelo menos 12-13 anos e sempre sob o julgamento do padre sobre a sua preparação e disposição.
     A "Pequena Nellie", embora tão doente que não podia ser deixada sozinha, inventava tudo, com imaginação e um desejo muito mais velho do que ela, para se aproximar de alguma forma do seu "Santo Deus", e assim uma manhã, voltando-se para a Srta. Hall, enfermeira, que tinha de assistir à Missa, disse que assim que ela recebesse a Sagrada Comunhão, que retornasse imediatamente a ela e lhe desse um beijo, o que para Nellie, assim, tornou-se o beijo de Jesus.
     Sua insistência junto às religiosas para receber a Eucaristia também tornou-se diária; as religiosas consternadas por não serem capazes de agradá-la, procuravam explicar a ela que não era possível.
     Um dia chegou ao Instituto um padre idoso que foi informado dos pedidos insistentes da pequena doente, e ele então quis conhecê-la; permaneceu no orfanato por algumas semanas, visitando-a todos os dias e interrogando-a sobre seu conhecimento das coisas de Deus e sobretudo do seu desejo da Eucaristia, se maravilhando pela bondade, inteligência e amor ao "Santo Deus, da pequena enferma. Ele conversou com a Madre Superiora das Irmãs, dando um parecer favorável para que Nellie pudesse receber a sua Primeira Comunhão, ele prometeu para isto falar com o bispo.
     O Bispo de Cork ficou muito espantado diante deste caso incomum, mas depois de uma longa oração na capela, ele escreveu uma carta à Superiora: "Sim! Eu abençoo a menina cheia de graça com todo o meu coração. Queira rezar por seu bispo na hora mais feliz de sua vida, que agora está perto", e enviou para a menina um santinho representando São João Evangelista que ternamente descansava a cabeça sobre o Coração de Jesus, na Última Ceia.
     De acordo com as regras da época, o bispo administrou antes o Sacramento da Confirmação, em seguida, no dia 6 de dezembro de 1907, primeira sexta-feira do mês, dedicada ao Sagrado Coração de Jesus, com uma solene celebração na igreja do Instituto que teve a participação de todas as irmãs e as crianças, Nellie, transportada em uma cadeira com almofadas, e precedida por sua irmã Maria com uma vela acesa, se aproximou do altar e finalmente recebeu a Sagrada Comunhão, o seu "Santo Deus".
     Foi indescritível a alegria experimentada pela criança, que uma vez transportada de volta para a cama de seu quarto, recebeu radiante os adultos e as crianças do Instituto que queriam ver a pequenina abençoado, trazendo-lhe pequenos presentes.
     Seus últimos dias transcorreram entre a resistência ao sofrimento físico cada vez mais em ascensão e o desejo diário de receber a Sagrada Comunhão, que ela recebeu 32 vezes em menos de dois meses.
     Toda vez que recebia o Pão dos Anjos, a face de Nellie se transfigurava, ficando várias horas absorvida em oração e ação de graças, com uma maturidade muito superior à sua idade, confortando todos aqueles que em torno de si sofriam, lembrando-lhes a Paixão de Jesus.
     Tudo isso acontecer com uma menina de quatro anos e meio parece incrível, especialmente quando visto com os nossos olhos modernamente racionais, mas é tudo verdade, e para isso devemos nos curvar à vontade de Deus que opera milagres através das almas mais simples
     Depois de uma longa agonia, também assistida por seu pai e irmã, Nellie Organ morreu em um domingo, 2 de fevereiro de 1908, Festa da "Candelária" (Purificação de Maria). Ela foi enterrada no Cemitério de São José, em Cork, porém um ano depois transladaram seus restos mortais, que encontraram intactos, para o Cemitério do Convento.
     No ano seguinte, os alunos do orfanato tiveram a ideia de fazer uma Novena à "Pequena Nellie" para pedir-lhe para obter um "sinal" que inspirasse o Papa São Pio X a dar a todas as crianças do mundo a possibilidade de receber a Primeira Comunhão. Alguns meses mais tarde, com o decreto "Quam singulari", o Papa concedeu a primeira comunhão a todos as crianças que chegaram ao uso da razão. O mesmo Papa, informado sobre a história da menina irlandesa, em 21 de novembro de 1910, enviou a Bênção Apostólica, escrevendo de próprio punho "Nellie, ainda menina, foi chamada para o Céu".
       À intercessão da "Violeta da SS. Sacramento" foram atribuídas curas instantâneas e graças extraordinárias, que propagaram sua fama de pequena santa.

Adendo:
     1) A enfermeira, Srta. Hall, relatou uma atitude extraordinária de Nellie por ocasião de sua primeira visita à capela durante a Exposição do SSmo. Sacramento. Naquela manhã, a Srta. Hall levou Nellie para a capela. A menina nunca antes tinha visto a Sagrada Hóstia exposta no ostensório. Qual não foi a surpresa da Srta. Hall ao ouvir a criança dizer para ela sussurrando: “Mamãe, ali está Ele, ali está o Santo Deus!”  E com sua pequena mão apontava para o ostensório; depois disso, ela não tirava seus olhos da Hóstia, enquanto uma expressão de êxtase transfigurava sua face. Daquele dia em diante, por algum conhecimento interior, sem nenhum sinal exterior para guiá-la, Nellie sempre sabia quando havia Exposição no convento.
     2) Em 30 de janeiro de 1908, Madre Francisca foi vê-la. Sabendo que a vida da criança estava no fim, ela fala sobre o que ela sabia que a menina gostava. “Nellie, quando você foi para o Santo Deus, você vai pedir para Ele me levar? Eu desejo muito o Paraíso”. A criança olhou para a Madre perscrutando e seus belíssimos olhos pareciam brilhar com uma luz preternatural. Então ela respondeu solenemente: “O Santo Deus não pode levá-la, Mamãe, até a Sra. ficar melhor e fazer o que Ele deseja que a Sra. faça”. Madre Francisca Xavier Hickey viveu até os 99 anos de idade. Ela faleceu em 1960 no Instituto Bom Pastor de St. Paul, Minnesota.
     3) O Reverendo Dr. Scannell conta-nos como foi a exumação: “Estavam presentes: um padre (ele próprio, Pe. Scannell), a Enfermeira e duas outras testemunhas de credibilidade. Para grande espanto de todos, porque temos que ter em mente que a criança morreu de phthisis (um desgaste do tecido, usualmente a tuberculose pulmonar), o corpo foi encontrado intacto, exceto por uma pequena cavidade na mandíbula direita, que corresponde ao osso que foi destruído por caries quando a pequena ainda estava viva. Os dedos estavam bastante flexíveis e o cabelo tinha crescido um tanto. O vestido, a guirlanda e o véu da 1ª. Comunhão, com os quais ela havia sido sepultada, como fora seu desejo, estavam intactos. A medalha de prata de Filha de Maria estava tão brilhante como se tivesse sido polida recentemente; tudo, de fato, foi encontrado exatamente como no dia da morte de Nellie”.

http://www.mysticsofthechurch.com/2010/03/marie-rose-ferron-american-mystic.html

Venerável Galileu Nicolino, Passionista


    
     O Santo adolescente nasceu no dia 17 de junho de 1882 filho de Luigi e Loreta. Galileu inicia os estudos com quatro anos; com cinco já serve de secretário do pai e em condição de escrever cartas ditadas. Começa a confessar-se com seis anos.
     No dia 26 de agosto de 1895, Galileu recebe a primeira comunhão na Igreja de Vetralla. Para preparar-se ao grande encontro fez dez dias de retiro com os religiosos passionistas. Ele volta para casa, mas sentiu que sua verdadeira família será aquela dos Passionistas. “Jesus na primeira comunhão”, dirá Galileu, “me fez conhecer que eu devo ser religioso passionista”.
     Com apenas doze anos, está decidido porém a seguir a sua estrada. No dia 5 de março de 1895, chega ao seminário de Rocca di Papa (Roma). Passa treze meses em Rocca di Papa e depois se transfere para Lucca para iniciar o noviciado. Veste o hábito passionista no dia 9 de maio de 1896 e toma o nome de Gabriele (Mas para não confundi-lo com Gabriel da Virgem das Dores, será sempre chamado Galileu).
     Na aurora de 27 de fevereiro de 1897, dia no aniversário de morte de São Gabriel da Virgem das Dores, levantando-se para a oração, Galileu sente tonteira e o sangue que lhe sai da boca. A tísica galopante já o contagiou. Mesmo não tendo a idade requerida, com uma faculdade concedida pelo superior geral, Galileu emite a profissão religiosa no dia 11 de maio de 1897: é finalmente passionista.
     Às três horas do dia 13 de maio de 1897, Galileu estende os braços, aperta na mão direita a imagem da Virgem Maria e sorri, e assim parte para junto de Deus. Foi declarado venerável no dia 27 de novembro de 1981. Venerável, isto é, heroico. Um adolescente. Galileu viveu quatorze anos, dez meses, vinte seis dias: o tempo de uma manhã.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

Beatos Jacinta e Francisco Marto, mensageiros de Na. Sra. de Fátima – 20 de fevereiro



     “Rezem, rezem muito e façam sacrifícios pelos pecadores, pois muitas almas vão ao inferno porque não há quem se sacrifique e peça por elas”, foi o que pediu a Virgem de Fátima a Lúcia, Francisco e Jacinta. E, neste dia 20 de fevereiro, a Igreja recorda a memória de dois desses videntes, os Beatos Francisco e Jacinta.
     Francisco nasceu em 1908 e Jacinta, dois anos depois. Desde pequenos aprenderam a tomar cuidado com as más companhias e, por isso, preferiam estar com sua prima Lúcia, que lhes falava sobre Jesus. Os três cuidavam das ovelhas, brincavam e rezavam juntos.
     De 13 de maio a 13 de outubro de 1917, a Virgem lhes apareceu em várias ocasiões na Cova de Iria (Portugal). As três crianças suportaram com valentia as calúnias, injúrias, más interpretações, perseguições e a prisão. Eles diziam: “Se nos matarem, não importa, vamos ao céu”.
     Logo depois das aparições, as crianças seguiram sua vida normal. Lúcia foi para a escola, tal como pediu a Virgem, e era acompanhada por Jacinta e Francisco. No caminho, passavam pela Igreja e saudavam Jesus Eucarístico.
     Francisco, sabendo que não viveria muito tempo, dizia a Lúcia: “Vão vocês ao colégio, eu ficarei aqui com o Jesus Escondido”. À saída do colégio, as meninas o encontravam o mais perto possível do Tabernáculo e em recolhimento.
     O pequeno Francisco era o mais contemplativo e queria consolar a Deus, tão ofendido pelos pecados da humanidade. Em uma ocasião, Lúcia lhe perguntou: “Francisco, o que prefere, consolar o Senhor ou converter os pecadores?”.
     Ele respondeu: “Eu prefiro consolar o Senhor. Não viu que triste estava Nossa Senhora quando nos disse que os homens não devem ofender mais o Senhor, que já está tão ofendido? Eu gostaria de consolar o Senhor e, depois, converter os pecadores para que eles não ofendam mais ao Senhor”. E continuou: “Logo estarei no céu. E quando chegar, vou consolar muito Nosso Senhor e Nossa Senhora”.
     Jacinta assistia diariamente a Santa Missa e tinha grande desejo de receber a Comunhão em reparação dos pobres pecadores. Atraía-lhe muito estar com Jesus Sacramentado. “Quanto amo estar aqui, é tanto o que lhe tenho que dizer a Jesus”, repetia.
     Certo dia, pouco depois da 4ª aparição, Jacinta encontrou uma corda e concordaram reparti-la em três e colocá-la na cintura, sobre a carne, como sacrifício. Isto os fazia sofrer muito, contaria Lúcia depois. A Virgem lhes disse que Jesus estava muito contente com seus sacrifícios, mas que não queria que dormissem com a corda. Assim o fizeram.
     A Jacinta, concedeu-lhe a visão de ver os sofrimentos do Sumo Pontífice. “Eu o vi em uma casa muito grande, ajoelhado, com o rosto entre as mãos, e chorava. Fora, havia muita gente; alguns atiravam pedras, outros diziam imprecações e palavrões”, contou ela.
     Por isso e outros feitos, as crianças tinham presente o Santo Padre e ofereciam três Ave-Marias por ele depois de cada Rosário. Do mesmo modo, as famílias iam a eles para que intercedessem por seus problemas.
     Em uma ocasião, uma mãe rogou a Jacinta que pedisse por seu filho que se foi como o filho pródigo. Dias depois, o jovem retornou para casa, pediu perdão e contou a sua família que depois de ter gasto tudo o que tinha, roubado e estado no cárcere, fugiu para uns bosques desconhecidos.
     Quando se achou completamente perdido, ajoelhou-se chorando e rezou. Nisso, viu Jacinta que o pegou pela mão e o conduziu até um caminho. Assim, pôde retornar para casa. Logo interrogaram Jacinta se tinha se encontrado com o moço e ela disse que não, mas que sim, tinha rogado muito à Virgem por ele.
     Em 23 de dezembro de 1918, Francisco e Jacinta adoeceram de uma terrível epidemia de bronco-pneumonia. Francisco foi piorando pouco a pouco durante os meses posteriores. Pediu para receber a Primeira Comunhão e, para isso, confessou-se e guardou jejum. Recebeu-a com grande lucidez e piedade. Depois, pediu perdão a todos.
     “Eu vou ao Paraíso, mas de lá pedirei muito a Jesus e à Virgem para que lhes leve também logo lá em cima”, disse para Lúcia e Jacinta. No dia seguinte, em 4 de abril de 1919, faleceu com um sorriso angelical.
     Jacinta sofreu muito com a morte do irmão. Mais tarde, sua enfermidade se complicou. Foi levada ao hospital da Vila Nova, mas retornou para casa com uma chaga no peito. Logo confiaria a sua prima: “Sofro muito, mas ofereço tudo pela conversão dos pecadores e para desagravar o Coração Imaculado da Maria”.
     Antes de ser levada ao hospital de Lisboa disse a Lúcia: “Já falta pouco para ir ao céu… Diz a toda a gente que Deus nos concede as graças por meio do Coração Imaculado de Maria. Que as peçam a Ela, que o Coração de Jesus quer que ao seu lado se venere o Imaculado Coração da Maria, que peçam a paz ao Imaculado Coração, que Deus a confiou a Ela”.
     Operaram Jacinta, tiraram-lhe duas costelas do lado esquerdo e ficou uma grande chaga como de uma mão. As dores eram espantosas, mas ela invocava a Virgem e oferecia suas dores pela conversão dos pecadores.
     Em 20 de fevereiro de 1920, pediu os últimos Sacramentos, confessou-se e rogou que lhe trouxessem o Viático, porque logo morreria. Pouco depois faleceu; tinha apenas dez anos de idade.
     Os corpos do Francisco e Jacinta foram transladados ao Santuário de Fátima. Quando abriram o sepulcro de Francisco, viram que o Rosário que lhe colocaram sobre seu peito estava envolvido entre os dedos de suas mãos. Quanto ao corpo de Jacinta, 15 anos depois de sua morte estava incorrupto.
     No dia 13 de maio de 2000, o Papa João Paulo II esteve em Fátima, e do ‘Altar do Mundo’ beatificou Francisco e Jacinta, os mais jovens beatos cristãos não mártires.

Aparições particulares a Jacinta
Jacinta vê o Santo Padre
     Lúcia assim relata na sua Terceira Memória:
     Um dia, fomos passar as horas da sesta para junto do poço de meus pais. A Jacinta sentou-se nas lajes do poço; o Francisco, comigo, foi procurar o mel silvestre nas silvas dum silvado duma ribanceira que aí havia.
     Passado um pouco de tempo, a Jacinta chama por mim:
     – Não viste o Santo Padre? – Não! – Não sei como foi! Eu vi o Santo Padre em uma casa muito grande, de joelhos, diante de uma mesa, com as mãos na cara, a chorar. Fora da casa estava muita gente e uns atiravam-Ihe pedras, outros rogavam-lhe pragas e diziam-lhe muitas palavras feias. Coitadinho do Santo Padre! Temos que pedir muito por Ele.
     Em outra ocasião, fomos para a Lapa do Cabeço. Chegados aí, prostramo-nos por terra, a rezar as orações do Anjo.
     Passado algum tempo, a Jacinta ergue-se e chama por mim:
     – Não vês tanta estrada, tantos caminhos e campos cheios de gente, a chorar com fome, e não têm nada para comer? E o Santo Padre em uma igreja, diante do Imaculado Coração de Maria, a rezar? E tanta gente a rezar com Ele?
Visões da guerra
     Um dia fui a sua casa, para estar um pouco com ela. Encontrei-a sentada na cama, muito pensativa.
     – Jacinta, que estás a pensar? – Na guerra que há-de vir. Há-de morrer tanta gente! E vai quase toda para o inferno! Hão-de ser arrasadas muitas casas e mortos muitos padres (tratava-se da 2ª. Guerra Mundial). Olha: eu vou para o Céu. E tu, quando vires, de noite, essa luz que aquela Senhora disse que vem antes, foge para lá também!
     – Não vês que para o Céu não se pode fugir?
     – É verdade! Não podes. Mas não tenhas medo! Eu, no Céu, hei-de pedir muito por ti, por o Santo Padre, por Portugal, para que a guerra não venha para cá, e por todos os sacerdotes.
Visitas de Nossa Senhora

     A 23 de dezembro de 1918, Francisco e Jacinta adoeceram ao mesmo tempo. Indo visitá-los, Lúcia encontrou Jacinta no auge da alegria.
     Na sua Primeira Memória, Lúcia conta:
     Um dia mandou-me chamar: que fosse junto dela depressa. Lá fui, correndo.
     – Nossa Senhora veio-nos ver e diz que vem buscar o Francisco muito breve para o Céu. E a mim perguntou-me se queria ainda converter mais pecadores. Disse-Lhe que sim. Disse-me que ia para um hospital, que lá sofreria muito; que sofresse pela conversão dos pecadores, em reparação dos pecados contra o Imaculado Coração de Maria e por amor de Jesus. Perguntei se tu ias comigo. Disse que não. Isto é o que me custa mais. Disse que ia minha mãe levar-me e, depois, fico lá sozinha!
     Em fins de dezembro de 1919, de novo a Santíssima Virgem se dignou visitar a Jacinta para Ihe anunciar novas cruzes e sacrifícios. Deu-me a notícia e dizia-me:
     – Disse-me que vou para Lisboa, para outro hospital; que não te torno a ver, nem os meus pais; que, depois de sofrer muito, morro sozinha, mas que não tenha medo; que me vai lá Ela buscar para o Céu.
     Durante a sua permanência de 18 dias no hospital em Lisboa, Jacinta foi favorecida com novas visitas de Nossa Senhora, que lhe anunciou o dia e a hora em que haveria de morrer.
     Quatro dias antes de a levar para o Céu, a Santíssima Virgem tirou-lhe todas as dores. Nas vésperas da sua morte, alguém lhe perguntou se queria ver a mãe, ao que ela respondeu:
     - A minha família durará pouco tempo e em breve se encontrarão no Céu… Nossa Senhora aparecerá outra vez, mas não a mim, porque com certeza morro, como Ela me disse.

Fontes:

Venerável Ana de Guigné - 14 de janeiro

Uma tão grande alma para uma menina tão pequena 
    
     “Temos muitas alegrias na terra, mas duram pouco; a que permanece é a de ter realizado um sacrifício”. Palavras ditas por uma criança que viveu pouco mais de 10 anos! O intenso amor a Deus e aos outros dava aos seus sacrifícios um elevado valor sobrenatural. “Nada custa quando O amamos”, dizia ela, pensando na conversão dos pecadores e alívio dos doentes.
     A Venerável Ana de Guigné, a mais velha de quarto irmãos, nasceu em 25 de abril de 1911, em Annecy (Alpes franceses). Seu pai era o Conde Jacques de Guigné e sua mãe Antonieta de Charette. O Conde era tenente do 13º. Batalhão, Chambéry de Chasseurs Alpins. A avó materna de Ana Francisca Eulália Maria Madalena de Bourbon-Busset era uma descendente direta do sexto filho do Rei São Luís IX de França. A mãe de Ana era sobrinha neta do General François de Charette, um dos líderes da contra-revolução da Vendeia.
     Quando Jacques (Jojo) nasceu 15 meses depois de Ana, esta ficou enciumada, jogava coisas nos olhos do bebê, inclusive uma vez chegou a dar-lhe um pontapé. Felizmente isto não durou muito e logo ela se sentiu feliz por ser a mais velha. Os primeiros 4 anos de Ana foram difíceis: era muito difícil de controlar. Mas logo ela haveria de mudar.
     Em setembro de 1913 Madalena nasceu e em janeiro de 1915 Maria Antonieta. Ana era a madrinha de Maria Antonieta, que era chamada por todos de Marinete. Quando Ana tinha 3 ½ começou a guerra entre a França e a Alemanha, e seu pai foi enviado para o front. Um mês depois ele volta ao lar após grave ferimento. Ana, que amava imensamente seu pai, começou a cuidar dele trazendo-lhe livros e ajeitando as cobertas. Após nova ida para o front, ele é ferido ainda mais do que anteriormente. A Sra. Guigné vai visita-lo no hospital de Lyons levando Ana; a menina ficou comovida quando a mãe mostrou-lhe os soldados feridos.
     Em 3 de maio, sentindo-se melhor, o Conde partiu novamente para o front. Na Alsácia, em 22 de julho de 1915, de Guigné, após receber a absolvição, liderou o ataque com seu homens. Com um grande sinal da cruz o Conde foi morto. A notícia de sua morte foi dada a Sra. Guigné em 28 de julho.
     Naquela manhã a provada viúva conta para Ana que seu pai morrera. Chorando, ela disse para Ana: “Se você deseja me consolar, você precisa ser boazinha”. Olhando longa e pensativamente os olhos de sua mãe, a menina compreendeu que para agradar a Deus ela precisava ser boa e Ana resolveu ser boa para agradar sua mãe. O dia todo Ana ficou pensativa, tentando fazer as outras crianças se comportarem. “Você precisa ser bom, Jojo, porque a mamãe está triste”. Daí em diante não houve mais cenas temperamentais nem egoísmos. Mas esta grande mudança não foi fácil para Ana; embora ninguém adivinhasse a batalha diária com ela mesma, ela lutou.
     Quando Ana tinha 4 anos, ela estava caminhando com seu avô e eles passaram por uma armazém de trigo. Seu avô perguntou: “Ana, você sabe o que se faz com o trigo?” Ana respondeu: “Não, vovô”. “O fazendeiro apanha o trigo e então o moi e faz a farinha para nós. Nós usamos essa farinha para fazer pão e também as Hóstias que o padre nos dá na Missa. Você sabe o que a Hóstia se torna?” Ana respondeu: “O Pequeno Jesus vem e se esconde na Hóstia branca, que se torna Jesus”.    
     Um mês antes de seu pai falecer, Ana mencionara o desejo de se preparar para a 1ª Comunhão. No outono de 1915, a Sra. Guigné colocou-a na aula de catecismo dada por Madre São Raimundo no Convento Auxiliadora. A Madre São Raimundo percebeu que Ana, embora fosse uma criança de apenas 5 anos, era mais adiantada do que dos restantes alunos. “Eu logo vi que Ana era uma criança privilegiada; mas o que mais me causou admiração foi isto: os outros não tinham ciúmes dela, embora ela fosse mais inteligente do que qualquer um deles e a mais nova. Todos a amavam e a admiravam. Eu penso que é porque ela nunca tentou se exibir ou se fazer de melhor do que ninguém. Ela era gentil tanto com as crianças mais mimadas quanto com as que se comportavam bem”.
     A 1ª Comunhão foi para ela um farol que iluminou o resto da sua vida. Devido sua tenra idade (6 anos) necessitou uma licença especial; foi admitida ao sacramento após um minucioso exame que levou o padre inquiridor a confessar: “Não somente está pronta como desejo que vós e eu estejamos sempre ao nível de instrução desta menina”.
     Em 26 de março de 1917 Ana fez a 1a. Comunhão; era uma segunda-feira da semana da Paixão e festa de Nossa Senhora da Assunção, que fora transferida para este dia porque o dia 25 caíra no Sábado da Paixão. No grande dia festivo, Ana deixou um bilhete sobre o altar: “Meu pequeno Jesus, amo-Vos e, para Vos agradar, tomo a resolução de obedecer sempre!” Assim prometeu, assim fez…
     Ana tinha grande devoção a Nossa Senhora das Dores porque Ela era “Nossa Senhora da Consolação”. Este título ela deu a uma pequena imagem que havia no jardim, junto à qual as crianças brincavam. Ali ela ia para pedir ajuda quando o auto controle se tornava mais difícil.
     Aos 10 anos ela resolveu imitar Nosso Senhor em tudo: “Como eu farei isto? Combatendo todos os obstáculos que impedir Jesus de crescer em mim: minhas faltas, meu amor próprio, minha preguiça... Isto deverá ser um combate diário”. Ela fez estas três resoluções: “Eu preciso ter: 1) limpeza (de alma); 2) roupas apropriadas; 3) ornamentos – as boas ações”.
     Ana escreveu: “Minha alma destina-se ao Paraíso. As pessoas estão muito preocupadas com sua aparência exterior e dificilmente com suas almas... Minha alma foi feita para a vida eterna, para infinitamente feliz ou infinitamente infeliz. O Bom Deus deseja que ela seja eternamente feliz. Isto depende somente de mim. Mamãe não pode fazer este trabalho para mim”.
     Certa vez um incêndio destruiu um casa pobre próxima e Ana, ouvindo que a viúva e as crianças ficaram sem lar, pediu a sua mãe se eles podiam fazer um bazar. As quatro crianças prepararam um “chá” que foi “servido” para clientes como a mãe, o avô e tia Paula, que ficaram contentes de pagar um montante que as crianças logo encaminharam para a família da viúva.
     Em novembro de 1919, Ana escorregou no gelo e feriu um músculo de seu joelho. Ela ficou bastante machucada e tentava se erguer; sua mãe correu para ajudá-la, mas embora tivesse lágrimas nos olhos, não soltou um gemido. “Sinto muito por tê-la assustado, mamãe. Eu estou bem. Não é nada”. Um ano depois de ferir seu joelho ela começou a ter muita dor de cabeça. Para não chamar a atenção para suas terríveis dores de cabeça, Ana continuou a fazer os seus trabalhos escolares e outras atividades, mas finalmente algo chamou a atenção de Madre São Raimundo, que perguntou se Ana tinha dores de cabeça, ao que ela respondeu afirmativamente. 
     Ana pacientemente oferecia todos estes sofrimentos sem reclamar. A alguém que lhe disse: “Pobre Ana, você sofre corajosamente”, ela respondeu: “Oh não, eu não estou sofrendo; eu estou apenas aprendendo a sofrer”.
     Em dezembro de 1921 as dores de cabeça retornaram, mas o médico não pensou ser nada alarmante, pois ela não parecia pior, apenas um pouco mais calma do que o costume. Mas em 19 de dezembro de 1921, as dores de cabeça se tornaram tão severas, que ela foi levada para seu quarto. O médico continuou pensando que não era nada sério até que em 27 de dezembro, quando ele viu que Ana estava em coma concluiu que ela tinha meningite.
     Pela tarde ela recobrou a consciência, mas a terrível dor de cabeça, a febre e a dor nas costas faziam sua face se contorcer devida a dor. Ela resolveu: “Eu desejo oferecer meus sofrimentos como Jesus fez na Crus”. Com uma incrível fortaleza, ela nunca reclamava ou chorava. “Você está consolando Jesus e convertendo pecadores”, sua mãe lhe recordava. Ela respondeu: “Bem, então, se é assim, desejo sofrer ainda mais”. Ela foi ouvida dizer certa vez “O, querido Deus, eu estou muito mal!” Uma vez, quando ela estava delirando, ouviram-na gritar: “Eu fui fiel, Jesus? Pequeno Jesus, tenho medo de não ter sido valente. Eu não rezei o suficiente. Querida Santa Ana, tem piedade de meus pecados”.
     Aproximando sua morte, Ana nunca falava de sua morte próxima diante de sua mãe, para não causar sofrimento a ela.  Ana sempre agradecia aquele que tinha feito alguma coisa para ela. Quando o confessor vinha ouvi-la em confissão e lhe dava a comunhão, antes do padre deixar o quarto, ela o chamava e lhe agradecia.
     No dia 30 de dezembro, Ana recebeu a Extrema Unção. No Dia do Ano Novo ela parecia estar se sentido melhor. Mas dois depois o médico constatou que os músculos do peito estavam paralisados e Ana teria ataques de sufocação que duraria horas. Por duas semanas ela sofreu desta maneira e na noite de 13 de janeiro Ana pergunta a sua tia, que era religiosa: “Irmã, posso ir com os anjos?” “Sim, minha querida criança”. “Obrigada, Irmã. Oh obrigada!”. Às 5:25 do sábado, 14 de janeiro de 1922, Ana olhando obedientemente pela última vez para sua mãe, faleceu.
      Esta pequena menina é uma “santa”, é o veredito geral. A sua professora deixou o seguinte testemunho: “Foi ela que me ensinou o que é amar Deus”.  Os testemunhos abundam, artigos são publicados e o bispo de Annecy inicia em 1932 o processo de beatificação.

     Os estudos conduzidos em Roma sobre a possibilidade da heroicidade das virtudes da infância foram concluídos positivamente em 1981 e a 3 de março de 1990 o decreto reconhecendo a heroicidade das virtudes de Ana de Guigné e declarando-a venerável era assinado pelo papa João Paulo II e indicou-a como exemplo para todas as crianças e não só elas.
Ana aos 9 anos, imagem da inocência